segunda-feira, fevereiro 27, 2012

Como se não houvesse amanhã, ao longe

Marc Chagall

Como se não houvesse amanhã e perante este lago imenso de neblina que avisto, houvesse um deus que me dissesse que o escuro dos outros,é branco e que ainda que todos vejam escuro, sombrio; nada mais é do que branco.
Como se não houvesse amanhã eu insisto nas veredas tapadas pelos calcanhares dos que se dizem Aquiles, sem o ser; insisto nos olhares de Linceu - sagazes porque permitem ver mais na opacidade. Quero lá saber se o amanhã não chega (ele pode não chegar!); já não me assusta e ao longe já passou, num barco que encalhou nas montanhas a dor.
Como se te dissesse todos os sons que as palavras escritas não serão, nunca, capazes de inaugurar...

Ao longe um rapaz grita; uma bola estilhaça e do outro lado alguém sussurra a palavra: "Amor". Presente, presente, presente!

Como se o amanhã não se queira demorar em mim (não sei se ele existe; ou eu!) mas como se hoje todas as palavras fossem uma chuva escassa dos sentidos que o sangue pede, no interior.

Todos os amanhãs tapam feridas que o hoje precisa.

segunda-feira, fevereiro 20, 2012

Todas as coisas que o amanhã não sabe




"A filha dos corvos" imagem de Michelle Dawson

Nos estilhaços perdidos no peito encontro vidros mais brilhantes do que Sirius.
Não digas a pessoa alguma o que o amanhã não sabe. Mas nunca adormeças sem fazeres de um estilhaço um rasgo de luz, num outro peito.
Todas as coisas que o amanhã não sabe, podem não ser feridas para o dia que hoje acontece.
E tudo o que hoje acontece pode não se repetir amanhã.
Saibas que há um só lugar onde o Tempo não entra: quando fazes de um estilhaço, um céu aberto.
E queres morar nele ainda que desconheças todas as coisas que o amanhã não sabe…

domingo, fevereiro 19, 2012

Tudo o que o amanhã pode não trazer.

Imagem de Mattijin's

Escrevo para sentir mais perto tudo o que o amanhã pode não trazer.
Escrevo para interromper dores que trago no peito, como feridas abertas.
Escrevo sem saber de onde vem o que sinto mas por saber quem sou.
Escrevo para sentir mais perto tudo o que o amanhã pode não trazer.
Escrevo como quem encerra desejos porque magoam partes humanas.

Mas sobretudo escrevo para sentir mais perto tudo o que o amanhã pode não trazer.
E adormeço. Sirius brilha nas letras que escrevo mas brilha mais nas palavras que calo em mim, para sentir mais perto tudo o que o amanhã pode não trazer.